Neil Gaiman é um dos autores mais populares da atualidade. E após assistir a MasterClass do autor, isto é o que tenho para partilhar convosco.
Nós usamos histórias desde o início da humanidade para aprendermos. Na ficção transmitimos a verdade com histórias, que são fundamentalmente a contradição mais gloriosamente gigante que podes imaginar. O que estamos a dizer é que usamos mentiras. Estamos a levar pessoas que não existem, e coisas que não aconteceram a essas pessoas para lugares que não existem, e estamos a usar essas coisas para comunicar coisas verdadeiras às crianças.
Neil Gaiman aconselha todo o escritor a ter uma pilha de textos, músicas, livros, pessoas que conhecemos aponte num caderno ou formato digital, como fonte de inspiração. Uma vez que as nossas influências são todo o tipo de coisas. As ideias obtêm-se juntando duas coisas. Juntando algo que nunca foi visto até hoje. Como o exemplo que o autor dá, “e se um lobisomem mordesse uma cadeira e essa cadeira matasse alguém?”.
Para encontrarmos a nossa própria voz teremos que começar por imitar os autores que gostamos e conhecemos e escrevermos até encontrarmos a nossa própria voz. Depois de escreveres 10.000 palavras, 30.000 palavras, 60.000 palavras, 150.000 palavras, um milhão de palavras, terás a tua própria voz. A tua voz é aquilo que não consegues deixar de fazer. A tua voz estará presente quer estejas a escrever uma fantasia ou uma ópera espacial.
Mas o que é uma história? “A história é algo fictício que faz com que vires as páginas e que não te sintas enganado no final.” Para desenvolver a história temos que perguntar “E agora, o que vai acontecer?” A primeira coisa que tens que fazer, é importar-te com os teus personagens, se não te importares, ninguém se irá importar.
Assim que tens uma ideia, escreve tudo aquilo que sabes. Podem ser rabiscos, palavras circuladas, qualquer coisa. Continua a escrever pensando onde queres chegar e não pares.
Quando começamos a escrever não pensamos que vamos escrever aquele livro. Pensamos sim, na história que irá dar origem a esse livro. Tens que permitir que o conflito aconteça. E tens que saber o que querem os teus personagens. Muitas vezes é isso que faz desenrolar a história. E apenas um deles pode ter o que quer. E lembra-te que as personagens para o bem e para o mal, sempre conseguem o que precisam. E não o que querem.
O que os personagens querem e o que os personagens precisam sempre impulsionaram cada história e sempre determinam como cada personagem irá se comportar, o que vai acontecer e como eles interagem com outros personagens.
Ao descobrires como soam as personagens, como falam, irás descobrir o seu carácter através do diálogo. Precisas de saber como a pessoa que está a falar, se parece. Tens que a visualizar. Precisas conhecer bem os teus personagens para saber se fariam tal coisa.
Quando tens muitos personagens na tua história, precisas de lhes dar algo que o torne diferente de todos os outros. Ao escreveres características visuais e verbais estás a ajudar o leitor a distinguir as personagens.
Ao criares um mundo, precisas de olhar o mundo lá fora, pensa nos lugares onde já estiveste. Fá-los maiores. Fá-los menores. Como seria uma escola que cobrisse uma cidade inteira? Como seria se fosse uma ilha? E se estivesse a flutuar no ar? Como chegarias lá?
Permite que os teus personagens descobram as regras do mundo onde estão. As pessoas descobrem as coisas ao errarem. Descobre-se que o fogo queima pondo a mão nele.
Descreve o que precisa ser descrito. Explica o que precisa ser explicado. Para a descrição, o autor tenta montar uma cena para as pessoas. Vai descrever uma pessoa. Um portão. Um túmulo. Mas o que o autor vai fazer é assumir que o leitor sabe como é que se parece uma árvore, uma casa, uma porta. E não precisa ser uma coisa muito grande para ser distinguível de outra igual a ela. Basta dizer que a árvore parece uma mão apertada tentando agarrar as nuvens. E, de repente, sabes que aquela árvore é diferente. Isto evoca uma emoção.
Ao apelar aos cinco sentidos estamos a fazer com que o leitor sinta as coisas que lê muito mais vivamente. No entanto, o cheiro é sobrevalorizado na escrita. Já o toque, um dos mais usados, cria uma emoção. Se o autor disser que o personagem tocou em algo húmido e quente, este é o toque dos pesadelos. Ou assim, o conhecemos.
Como lidar com o bloqueio de escritor?
Pensasse que o bloqueio de escritor é algo pelo qual nada podes fazer, o que é mentira. Na verdade, apenas ficaste bloqueado numa cena qualquer da história. Para lidar com isso há duas regras:
1. Comece a um passo de distância, ou seja, não fiques a olhar para a página em branco, vai fazer outra coisa qualquer.
2. Volte fingindo que nunca o leu antes, ou seja, começa do zero e lê a história por completo.
Uma vez que fazemos isso, a história irá tornar-se óbvia. O problema está sempre antes, nas linhas anteriores às que paraste.
O processo de escrita está dividido em dois. É primeiro um processo de criação e depois um processo de edição e correção. Após escrever uma história, Neil Gaiman, afasta-se do rascunho durante uma semana a 10 dias e imprime. Ao voltar, finge que nunca o leu antes e que nada sabe sobre o que está a ler. E faz anotações. Anotações sobre o que não faz sentido para ele enquanto leitor.
A diferença entre o primeiro rascunho e o segundo rascunho geralmente pode ser pequena. Mas é o rascunho mais importante. É onde irás reforçar sobre o que é a história e eliminar os lugares onde estás a escrever coisas que não são o assunto da história. E isso irá definir o que fica e o que sai. O processo de escrever o segundo rascunho, é fazer parecer que sabias o que estavas a fazer o tempo todo.
Quando as pessoas dizem que algo não funciona na tua história. É verdade. Acredita nelas. Essa informação é importantíssima. Mas quando te dizem, que algo está errado e te dizem como corrigir, geralmente estão errados. Quando algo não resulta, normalmente o problema está antes no texto. E por vezes, é algo que precisa desaparecer. Ás vezes é algo que precisa ser escrito para configurar algo. Mas recebe essa informação como algo que não funciona para o leitor e apenas isso. Se começares a corrigir para este ou aquele leitor, estarás a escrever a história deles e não a tua.
Regras para escritores:
1. Tens que escrever. Se não escreveres nada acontecerá.
2. Tens que terminar o que escreves.
3. Depois de terminares, tens que enviá-la ao mundo para alguém que possa publicá-la.
4. Quando voltar, que provavelmente irá voltar, tens que a enviar novamente. Continua até a conseguires publicar.
5. Começa a escrever a próxima história. Continua.
Se perguntares a Neil Gaiman o que deves fazer para seres um escritor, a resposta será esta: “deves escrever” e “deves terminar as coisas” e se não tens nada para dizer “vai lá para fora, para o mundo”. Ler é fantástico. Lê tudo o que puderes. Escreve tudo o que puderes. Mas viva muito, porque tudo o que acontece na vida vai acabar na ficção. Vais precisar de todos os seres humanos que já conheceste. Vais precisar de tudo aquilo que vês, porque um dia vais escrever uma história.